segunda-feira, 4 de maio de 2009

Discurso na Câmara Federal do Dep. Paulo Teixeira sobre a situação das Cooperativas de Trabalho


Senhor presidente, senhoras e senhores deputados

Gostaria de relatar aqui uma situação que está condenando ao desaparecimento um tipo de associação para o trabalho que tem sido talvez a única alternativa para geração de renda de muitos trabalhadores, especialmente mulheres, com pouca formação profissional e quase nenhuma escolaridade.

Para demonstrar as dificuldades que essas cooperativas de trabalhadores enfrentam, tomo como exemplo a história da Cooperlimp - Cooperativa de Limpeza Jardim Gonzaga. A Organização surgiu em uma comunidade muito pobre, formada por moradores de um bairro de uma cidade do interior de São Paulo, a partir de iniciativa de professores da Universidade Federal de São Carlos; iniciativa esta que também originou a Incubadora Regional de Cooperativas Populares nesta universidade.

A cooperativa nasceu como uma maneira alternativa de as pessoas conseguirem sobreviver. São pessoas que foram expulsas do mercado formal e tradicional de trabalho e que também lutam para construir outros tipos de relações entre pessoas da sua comunidade, destas com seu ambiente, e do bairro com o restante da cidade, no sentido de acabar com o preconceito da comunidade com os outros bairros.

Ela foi a primeira de um conjunto de empreendimentos solidários que, ao longo dos anos, foram sendo formadas pela mesma população, sempre em busca de condições mais dignas de vida, utilizando principalmente os recursos que têm, como a força do seu trabalho e a vontade de superar os obstáculos. Contaram com alguns apoios tanto da Universidade, via Incubadora, quanto, nos últimos anos, do poder público.

A decisão de formação de uma cooperativa para prestação de serviços na área de limpeza foi tomada, entre outras razões, pela possibilidade de as pessoas contarem, em termos de capital, com pouco mais do que sua capacidade de trabalhar. Cotas-parte foram pagas com a doação de “meios de produção” que as pessoas tinham em suas casas, como baldes, vassouras e panos de chão.

Em dez anos, a cooperativa cresceu e superou a marca de 200 pessoas com postos de trabalho e renda com que mantêm suas famílias. A cooperativa segue os princípios do Cooperativismo Popular e tem sido capaz de garantir, por meio da criação de fundos e da distribuição destes recursos conforme decisões coletivas tomadas em assembléias (que ocorrem mensalmente) , benefícios correspondentes aos direitos trabalhistas: os sócios da cooperativa recebem, mensalmente, além da renda correspondente aos postos de trabalho que ocupam em nome da Cooperativa, valores correspondentes a descanso anual, abono natalino e seguridade social. A cooperativa garante, ainda, que sejam efetuados os pagamentos devidos de INSS correspondentes a cada um dos sócios.

As decisões fundamentais da Cooperativa são tomadas coletivamente, em assembléias, e decisões operacionais ou urgentes são tomadas, sempre, por um grupo ampliado em relação à diretoria, que inclui representantes (ou mesmo a totalidade) do Conselho Fiscal e do Conselho de Ética, criado e regulamentado por meio de Regimento Interno.

Tendo iniciado suas atividades por meio da ocupação de postos de trabalho contratados pela Universidade Federal de São Carlos, inicialmente por meio de uma iniciativa de apoio da instituição ao empreendimento surgido de projeto da Incubadora, a Cooperativa passou a concorrer a postos de trabalho em editais públicos, dentro da Universidade e em outros setores, ampliando o número de sócios, desde sua criação, de aproximadamente trinta, para os atuais cerca de 250.

Desde sua criação, os associados têm enfrentado tentativas de empreiteiras de desmoralizar e impedir a Cooperativa de oferecer e prestar seus serviços, respondendo com comprovação de sua legitimidade e capacidade de oferecer serviço de qualidade e preço justo.

A ameaça agora é ainda maior. Essa e outras cooperativas correm o risco iminente de desaparecerem exatamente pela ação dos órgãos que deveriam atuar de modo a proteger aqueles que mais necessitam, não de privilégios, mas de justiça e atendimento ao direito de trabalhar digna e honestamente.

Desde que a Procuradoria Geral da República firmou, com o Ministério Público do Trabalho, um termo de ajuste de conduta que, erroneamente, generalizou para todas as cooperativas de serviços, proibições e penalidades que seriam desejáveis e cabíveis naquelas situações em que efetivamente sejam comprovadas má fé e má utilização do conceito de cooperativa, com práticas precarizadoras de trabalhadores – o que efetivamente existe e precisa ser coibido pelo poder público - a Cooperlimp passou a ser penalizada com a perda de possibilidade de ocupar postos de trabalho.

A cooperativa foi proibida de participar em editais de órgãos públicos de nível federal e a chance de concorrer aos cerca de vinte postos de trabalho, na própria UFSCar, que vinha ocupando seguidamente ao vencer editais abertos pela instituição. Mesmo recorrendo a mandatos de segurança, a Cooperativa ficou impedida, a partir de 2005, de participar destes editais.

No final de 2008, a Cooperativa foi proibida, por meio da assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta, de assumir qualquer novo posto de trabalho, comprometendo- se a abrir mão de todos os que ocupava fora dos contratos vigentes com a Prefeitura Municipal de São Carlos, comprometendo- se a desaparecer como empreendimento ao final deles, em um período de dois anos.


As cooperativas e outros empreendimentos solidários de São Carlos e no Brasil vem recebendo apoio permanente para sua constituição, implantação, implementação e inserção no Movimento da Economia Solidária de agências como universidades, setores públicos de apoio à Economia Solidária (como o Departamento de Apoio à Economia Solidária da Secretaria de Trabalho da Prefeitura Municipal de São Carlos).

O que deseja a Cooperlimp, assim como as outras cooperativas que estão não mais sendo ameaçadas, mas impedidas de existir, sem que os responsáveis por este processo demonstrem preocupação com o que era, é e será das vidas destas pessoas, em função desta situação, é apenas e tão somente tratamento igual a todos os cidadãos, direito garantido pela Constituição Brasileira.

Que seja, com máxima urgência, aprovado no Senado Federal o Projeto de Lei de nº 131/2008, que constitui ferramenta mínima para lutar em condições um pouco mais justas pelos direitos que deveriam nunca sequer ser questionados, e que estão sendo, ao contrário, destruídos por estas ações contra iniciativas de organização popular para o trabalho.

Ações que terão como efeito principal a destruição do esforço coletivo de construção de relações de trabalho baseadas em cooperação, união, respeito e responsabilidades compartilhadas, exercitadas no dia a dia das cooperativas, em suas assembléias, na formulação de orçamentos, atitudes solidárias, éticas e responsáveis dos sócios, em favor do agravamento dos problemas em um mundo marcado pela ganância, divisão, egoísmo e exclusão.

O projeto de lei pode até não atender a todas as necessidades e reivindicações do Movimento, mas não aprová-lo imediatamente implicará danos irreversíveis para segmentos muito importantes deste movimento, sem qualquer segurança de que algo melhor possa vir em seu lugar.

Suas propostas avançam em vários aspectos no que interessa à organização de iniciativas coletivas de trabalho, e podem ser ainda, posteriormente, aperfeiçoadas.

Por isso, peço atenção ao projeto e respeito às cooperativas. E torço para que elas sobrevivam.

Era o que eu tinha a dizer.

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